
Herman Hesse (1877-1962) ultrapassou a fronteira dos principais pensadores da escola existencialista por conta de características pessoais, de suas obras e pelos caminhos que o levaram a produzir clássicos como Demian e Sidarta, dentre outros. Seus livros e princípios influenciaram fortemente movimentos como o hippie, o transcendentalismo e o pacifismo, e cativaram iniciantes e adeptos das filosofias orientais no Ocidente, principalmente a partir das décadas de 1960 e 1970.
Ele descobriu cedo que era necessário romper com o universo pessoal se quisesse trilhar o caminho do autoconhecimento. E aprendeu a fazer seu próprio caminho: fugiu ainda adolescente do seminário protestante, virou leitor voraz de filosofia, literatura e história e descobriu que o conhecimento era apenas uma abertura àquilo que vislumbrava. Na busca incessante por questionamentos, Hesse não ansiava propriamente por respostas. Queria ampliar o espectro das indagações. Suas principais obras refletem seu processo de conhecimento sobre quem era e o que fazia neste mundo.
As considerações a seguir terão como referência seu livro Sidarta, que muitos pensaram ser uma espécie de biografia romanceada da vida de Sidarta Gautama, o Buda, mas era, na verdade, um cruzamento das suas perguntas com os ensinamentos e experiências oriundas do budismo e o seu modo íntimo de buscar respostas e gerar mais questionamentos.
A aparente vida tranquila do personagem Sidarta, que guardaria semelhança com os passos do futuro Buda antes de despertar para o mundo de sofrimento e da realidade exterior, ganha contornos diferentes em Hesse: tenta conhecer os caminhos da iluminação, se desfaz do mundano, mas algo o chama sempre de volta à existência dualista. Entre idas e vindas, o personagem acaba por descobrir os prazeres da riqueza, do sexo e da vida farta, passando por novos dramas existenciais.
Sua grande descoberta não foi, propriamente, ser apresentado ao Buda (o Sidarta real), mas a um rio por um barqueiro – e tudo mudou profundamente na sua vida. Conhecer o rio, ficar enamorado das suas águas e movimentos deu ao Sidarta de Hesse um outro contorno: a compreensão do que era a vida, de que não passava de um ser como as partículas da água serena, que “falava com ele e para ele”. Os detalhes e o resto da história o leitor sabe lendo (ou relendo) a obra.
O fato é que Hesse virou ícone da contracultura dos anos 1960/70, suas obras até hoje são aclamadas e premiadas, venderam milhões de cópias e ecoam como mensagens de estímulo ao autoconhecimento.
Nessa mesma linha, alimentados historicamente por processos milenares de conhecimento e acumulação, além de experimentarem as influências em diversas partes do Oriente, as práticas filosóficas utilizadas por Hesse para construir seus livros, personagens e falar do conhecimento interior são, de fato, um legado de Sidarta Gautama – o Buda – e ganharam bilhões de adeptos no mundo todo.
Das linhas de pensamento filosófico que até hoje predominam em áreas como o Japão e a China, por exemplo, o Zen Budismo vem de raízes indianas, em contato com princípios do Taoísmo, mesclando ensinamentos de culturas milenares a práticas que se desdobram em atividades diversas no mundo do autoconhecimento e da chamada não-dualidade.
A propósito, um canal na plataforma Youtube se dedica a falar desse e de outros princípios básicos do Zen Budismo, a partir de estudos conduzidos por um grupo de praticantes de doutrinas orientais. O canal Corvo Seco (veja aqui) traz conteúdo inspirado em livros e conhecimentos difundidos por importantes figuras desse universo, com destaque para Shunryu Suzuki, monge, filósofo e mestre do budismo, um dos mais influentes do século XX nesse campo, ao lado de Osho, dentre outros.
Em A Mente Zen, de maneira didática, os produtores do Corvo Seco, apresentam trechos da obra de Shunryu Suzuki, com inserção de palavras do monge, comentários bem elaborados sobre o processo de autoconhecimento e, mais especificamente, acerca da prática do Zazen, cujo significado é, literalmente, “meditação sentada” (vídeo abaixo).
Em pouco mais de 20 minutos, o canal apresenta princípios básicos do Zen Budismo, destacando o Zazen, entrecortados por imagens, meditações, frases do monge que inspirou o vídeo e uma narração que transmite paz e simplicidade. Outros pensadores também são contemplados pela equipe do Corvo Seco e seguem linha semelhante à do vídeo acima.
Falar de Herman Hesse, sem dúvida, nos faz mergulhar rapidamente num oceano de conhecimentos milenares acumulados por pensadores e praticantes das filosofias orientais que até hoje inspiram gerações a sair da roda viva de um mundo conturbado como o que vivemos.
É uma maneira a mais de abrir a mente a pensamentos e práticas que guardam relação com a vida saudável, a simplicidade, a busca pelo autoconhecimento e as razões que levam muita gente a apostar tudo no acúmulo de riquezas, bens e tristezas. Para descobrir mais sofrimento a cada passo. E, claro, o que foi dito até aqui é uma gota no vasto acúmulo realizado por essas culturas.
Como disse no título, me referi apenas a ‘princípios básicos do Budismo’ – com a figura de Herman Hesse como ponto de partida para tocar no tema.