
Passados mais de sete anos do seu lançamento, a animação Festa no Céu ainda é um marco no cinema quando o assunto é o tratamento que a data dedicada em quase todo o Ocidente à celebração do Dia dos Mortos merece: delicadeza, simplicidade e cores vibrantes. A história destaca a vida de Manolo, um jovem mexicano dividido entre as expectativas da família e aquilo que diz seu coração – logo ele, de uma família de toureiros, mas com inclinações musicais e dono de um romantismo exacerbado.
A riqueza de detalhes do filme atrai o olhar infantil, mexe com sentimentos de qualquer adulto e toca num tema que é muito caro à religiosidade e às tradições ocidentais, como é o caso da perda de entes queridos que todos experimentamos ao longo da vida. O título original, em inglês, trata justamente do Livro da Vida – que tem o toureiro, seus familiares (vivos e mortos) como protagonistas. É uma colagem muito bem feita de situações entre os mundos dos vivos e dos mortos, em clara alusão à maneira como os mexicanos celebram a data em seu país – como uma “festa” – daí a sacada do nome dado à sua versão em português.
A condução do roteiro para a ‘viagem’ de Manolo ao mundo dos mortos e para vida dos que ficaram por aqui mereceria, por si só, um reconhecimento da originalidade da ideia por conta da costura feita entre esses dois universos: no filme, é possível acompanhar o tempo inteiro como vivem os habitantes da cidadezinha em seu cotidiano, enquanto correm os eventos no mundo espiritual, com mortos se confraternizando ou montando estratégias de poder.
O fio terreno da história, naturalmente, mistura paixão, amor, música e aventura, com cores vibrantes e a busca por um sentido à vida – e à morte ‘temporária’ – do jovem rapaz que se apaixona pela mocinha do povoado mexicano.
O tratamento dado ao assunto serve, certamente, até para abordagem deste tema complexo com crianças e jovens, já que ninguém pode colocá-lo totalmente à margem dos assuntos que entram e saem da nossa vida, em dados momentos. Sabemos que a morte já deu seus recados em nossa vida sem sequer mandar aviso, pois “viver é um sopro”, como se diz no popular, e ninguém está preparado para o que pode acontecer a cada um de nós o tempo inteiro.
O conforto, a aceitação e a compreensão desse fenômeno natural sempre carregará algum tipo de tabu, mas uma maneira sincera e sutil de falar da morte pode ser importante para aliviar as dores que esta causa. E até contribuir para entendê-la como uma parte do processo de existência – aceitemos ou não em dado momento da vida.