Um filme-manifesto distópico sobre racismo estrutural no Brasil

Cena do filme Medida Provisória, dirigido por Lázaro Ramos/ Foto: divulgação

O ideal é entrar no cinema para assistir ao filme Medida Provisória (2022), do diretor Lázaro Ramos, sem ter muitas informações a respeito da história. A intenção é ver a frio a proposta que a película traz: usar a distopia para escancarar um manifesto na tela sobre violência racial e suas entranhas nos diversos sistemas (econômicos, institucionais, políticos e de poder) – o chamado ‘racismo estrutural’. Outra coisa é perceber que o roteiro prende você como se fosse algo que conhecemos de algum lugar, de situações corriqueiras ou de pessoas com as quais cruzamos em diversos momentos da vida.

Não tenho nada a acrescentar ao que já foi dito sobre a história em si, coisa que cabe aos especialistas em cinema, críticos e quem se ocupa com análises mais apuradas de produções cinematográficas. O que me chamou a atenção, durante todo o filme, foi como Ramos conseguiu imprimir um ritmo de manifesto àquilo que seria simplesmente o desenrolar do racismo nosso de cada dia.

Tudo ocorre no Brasil, esse laboratório a céu aberto de experimentos insólitos que misturam negros racistas no governo, pobres ‘patriotas’, pelotões de evangélicos defendendo uso de armas e pregando toda sorte de crimes, além dos tradicionais trapaceiros da política e dos negócios que usam a fachada da ‘família’ para sua falcatruas -públicas e privadas. Detalhe: a produção é de 2014, muito antes de todo o cenário catastrófico produzido pelos extremistas no poder.

Esse caldo de mazelas, ódio e destempero institucional escorre na tela de Medida Provisória, enquanto pretos e pretas vividos por personagens que conhecemos da TV e do cinema estrebucham, resistem e são alvo das violências que as pessoas pobres – pretas e pardas, em geral – das comunidades e lugares distantes vivem no cotidiano. Por isso, acredito, o filme não poderia deixar de ser esse manifesto que é.

A obra não nega seu viés de contestação dos rumos que o país tomou com a extrema direita no poder, sendo, de algum modo, premonitória, por ter sido realizada antes disso se tornar real. Tem a nítida preocupação de mostrar que seu caráter político – como denúncia de uma realidade que se arrasta historicamente – está nas falas, nos rostos e nas manifestações de todos os personagens. Não tem nada ali que engane quem vai ver a produção.

No mais, a realidade está aí em todos os lugares, e somente no universo paralelo dos ditos ‘cidadãos de bem’ é que existe uma harmonia social que faz todo mundo sorrir e se abraçar no Brasil varonil. Quem assistir, com certeza descobrirá mais e mais nuances, além do que destaquei até aqui.

Só digo mais que é um filme extremamente potente! Veja e comente!

4 comentários sobre “Um filme-manifesto distópico sobre racismo estrutural no Brasil

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