Os pobres e o orçamento, aqui e no resto do mundo

Por Roberto Fontes *

Foto por Pixabay em Pexels.com

De repente, para assombro de boa parte do mundo, um surto de bondade franciscana assolou ricaços de algumas partes do planeta: eles querem pagar mais impostos! Reunidos este mês em Davos, na Suíça, estes senhores disseram candidamente que se dispõem a pagar mais impostos para reduzir a acachapante desigualdade que os torna cada vez mais ricos, enquanto os pobres ficam cada vez mais miseráveis. Parem o mundo que eu quero descer!

Eles disseram, sem meias palavras, que estamos vivendo numa era dos extremos da pobreza e ultra riqueza, misturado com a ascensão do nacionalismo antidemocrático (vide a infâmia do 8 de janeiro em Brasília), a degradação ambiental, a vulnerabilidade dos sistemas sociais dos países e – mais preocupante de tudo – o sumiço das oportunidades para bilhões de pessoas comuns – como você e eu – de ganhar o suficiente para viver com dignidade.

Literalmente, os mais de 200 bilionários signatários da carta (nenhum brasileiro, e temos muitos) repetiram o discurso do presidente Lula ao falar pela primeira vez depois de eleito em outubro do ano passado, e, mais recentemente, ao tomar posse para o terceiro mandato: é preciso inserir os pobres no orçamento. Não só os pobres brasileiros, mas os pobres de todo o planeta. São bilhões, que vivem à margem de qualquer proteção social.

Esta é a realidade decorrente de várias condicionantes. No Brasil, especialmente, o nosso sistema tributário é cruel e dá prioridade aos impostos indiretos, aqueles que incidem sobre o consumo. Um exemplo bem prático pra você entender, caro leitor: se estivessem simultaneamente no supermercado da esquina fazendo a feira, Jeff Bezos, o dono da Amazon, e seu Francisco, aquele simpático guardador de carros, pagariam o mesmo imposto sobre uma compra.

Esta crueldade tributária considera que ambos têm o mesmo poder de compra ao adquirir uma cesta básica. Aqui, os impostos indiretos, que incidem sobre a produção e o consumo, prevalecem sobre os impostos diretos, que tributam a renda e o patrimônio. Tecnicamente, isto se chama regressividade. Numa tradução para português coloquial, ganhando muito ou pouco, todo cidadão paga o mesmo valor do imposto ao comprar alimentos e roupas, por exemplo.

Projetos e mais projetos estão empilhados no Congresso Nacional, propondo a tributação sobre grandes fortunas. O Fisco brasileiro, por suas entidades estaduais e federais, elaborou uma proposta de Reforma Tributária Solidária que ataca a regressividade e propõe, entre outras coisas, aumentar a tributação sobre a renda e o patrimônio. Mas o Congresso é, majoritariamente, formado por milionários. E eles ainda não tiveram a sensibilidade dos bilionários de Davos.

Vou encerrar esta conversa, repetindo um trecho da Carta que eles publicaram na Suíça: “Os extremos são insustentáveis, muitas vezes perigosos e raramente tolerados por muito tempo. Então, por que, nesta era de múltiplas crises, continuamos tolerando a riqueza extrema? …Nossos representantes devem tributar a nós, os ultra ricos, e devem começar agora. Agora é a hora de enfrentar a riqueza extrema. Há um limite para o estresse que qualquer sociedade pode suportar“.

* Roberto Fontes é jornalista potiguar e especialista em Tributação

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